A
direita brasileira está em polvorosa. Mesmo tendo, durante todo o século
passado, dado golpes militares, enfraquecido líderes populares tradicionais e
manipulado a opinião pública contra candidatos seua adversários, não imaginavam
que, ao fim de tudo, uma candidatura de esquerda venceria uma eleição, ou
melhor, três seguidas. Não imaginavam que a mídia perderia o poder quase
absoluto que possuía de manipular a consciência dos eleitores. Estão
desesperados por perderem a perspectiva de mudar essa situação. Partem pro
embate como quem dá socos a esmo.
Típico
desse embate é a rotulagem. Palavras como democracia, ditadura, fascismo, entre
outras, são usadas demagogicamente, sem base conceitual aceitável, no intuito
de conquistar o senso comum. É um vale tudo conceitual. E nessa guerra suja
entram políticos, jornalistas e até, pasmem, acadêmicos. O mais recente caso é
o do historiador Marco Antônio Villa, em artigo publicado na Folha, sob o
título Ministério da Verdade: http://veja.abril.com.br/blog/augusto-nunes/feira-livre/ministerio-da-verdade/. O texto surpreende, mas não devia.
Surpreende ver um historiador renomado produzir um texto tão panfletário e de
uma verborragia tão rancorosa. Não devia surpreender porque o professor Villa
já é acostumado a esse tipo de atitude, como nesse texto http://paginadoenock.com.br/home/printpost/10539, em que é brilhantemente rebatido
por Altamiro Borges, ou quando defende a ditadura militar, sendo também
rebatido, dessa vez por outro jornalista, Luís Nassif: http://blogln.ning.com/forum/topics/marco-antonio-villa-e-a.
Ao
ver isso, vem-me à mente uma entrevista na revista Caros Amigos em que Leonardo
Boff diz que FHC não devia mais ser chamado de intelectual, pois julga a
sociedade a partir de um jogo de interesses. Não parte mais da ciência. É um
político. O mesmo acontece com Villa. Alguns podem perguntar, mas o que há de
mal nisso? À primeira vista, nada. O problema existe quando um acadêmico traz
uma análise política (pessimamente feita, por sinal), distorcendo horrivelmente
conceitos utilizados em sua ciência. Não esclarece, confunde. Por isso, não
pode se intitular professor.
Villa,
assim como seus colegas jornalistas da direita, faz um texto escatológico. Ao
lê-lo, tem-se a impressão de que vivemos numa ditadura, de que a esquerda odeia
a democracia e as liberdades e de que a imprensa de direita é a guardiã
legítima da moral e dos bons costumes contra o “perigo vermelho”. A questão é
que ele não se conforma com o fato de se ter um governo de esquerda e de que
esse seja formado por uma coalizão de partidos dos mais variados matizes
programáticos (coisa inimaginável, pois todo esquerdista seria um radical) que
deteria mais de 80% das cadeiras do Congresso. A saída então, é chamar de
ditadura. Como disse Millôr: “democracia é quando eu mando, ditadura é quando
você manda”. O professor cria inclusive um falso ar de temeridade, digna de um
prisioneiro num Gulag, falando em “rolo compressor do poder” e dizendo que o governo
age de forma policialesca.
Para
dar mais ênfase a esse tipo de discurso, Marco Antônio cita, como já é corrente
nessas abordagens, países da América do Sul governados pela esquerda, como a
Venezuela, o Equador e a Argentina, exemplos para a direita de governos
autoritários, apesar de possuírem Constituição, três poderes, e de terem sido
eleitos pelo voto popular. Millôr de novo!
O
grande herói pra ele é, claro, a imprensa, entendida aqui com a grande mídia.
Isso mesmo! Aquela que esconde as falcatruas dos tucanos. Aquela que chama
movimentos sociais de terroristas. Aquela que inventou a bolinha de papel.
Aquela que destrói reputações, que julga e condena sem provas seus adversários.
Aquela que se cala, ou mesmo censura, quando algo a atinge ou a seus comparsas,
para usar uma palavra que nosso ilustre historiador gosta de escrever em seus
textos contra o PT. Essa mídia, que apesar de vivermos num regime em que “o
rolo compressor do poder” age sobejamente, tratou o presidente da república
durante oito anos por anta, apedeuta, babalorixá de Banânia, mula, entre outras
alcunhas, e que nunca sofreu sequer um processo judicial. Só ela é capaz de acabar
com esse estado de coisas, já que “nossa sociedade civil é extremamente frágil”,
palavras de Villa.
Fico
pensando como seria uma aula do professor Villa. Afinal, escrever num jornal,
de frente pro nada, como até eu estou fazendo agora é fácil. Difícil é estar
diante de homens e mulheres que lêem textos acadêmicos e querer convencê-los de
toda essa pantomima. Tive colegas na faculdade que desbancariam o professor em
dois tempos. Parece que tanto estudo não valeu de nada.
E
é nessa sua própria postura que Marco Antônio Villa deveria encontrar o porquê
do fracasso da direita no Brasil, de 2002 pra cá. Ela ficou sem perspectiva, perdeu
o apoio popular e seus projetos estão sem fundamento. Além disso, sua saída
tradicional, como dar golpes e assassinar reputações através da imprensa,
estão, no primeiro caso, fora de cogitação, por falta do apoio de setores
estratégicos (Igreja, empresários, militares, congressistas) como antes ou,
como no segundo caso, não surtindo o efeito desejado. Falta aos conservadores
um projeto de nação, adaptado aos novos tempos de democracia. Só assim poderão
ser levados a sério pelos eleitores novamente. Senão, vão continuar estrebuchando
pateticamente, utilizando dessa politicagem verbal pra sobreviver.
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