domingo, 29 de janeiro de 2012

O EX-COMUNISTA


            Meu pai, que era um fumante inveterado, dizia que não há nada pior que um ex-fumante. Aliás, pior que isso só um ex-comunista. Por força de um processo de (de)formação mental inexplicável, o ex-comunista não se torna só um direitista. Ele passa a deter um discurso do mais baixo nível intelectual e analítico e do mais raivoso e desembasado apologismo ideológico. Não se torna um dialogante. Torna-se um sem-argumento, usando do puro ataque como arma discursiva.
            Exemplos pululam por aí: Reinaldo Azevedo, Arnaldo Jabor, Roberto Freire, Aloysio Nunes Ferreira, Soninha Francine, entre outros. E o discurso é sempre o mesmo, algo do tipo: “Na juventude eu era um incendiário, um rebelde. Na minha imaturidade da época, fui doutrinado pelos ideais de Marx, Lenin, Trotsky, Mao, e me tornei contra ‘tudo o que está aí’. Mas, graças a Deus (ou não, já que alguns continuam ateus materialistas) fui crescendo, adquiri maturidade, e vi que a realidade era outra. O que interessa é o emprego, a posição social e o dinheiro. Ir contra isso é pura utopia. Temos agora que livrar o mundo dessa raça, que busca através da mera anarquia, conquistar jovens incautos, como eu fui um dia, na busca por revalorizar a sociedade, tratando com igualdade os desiguais, entregando o mundo ao caos.”
            Quero deixar claro que não estou falando aqui que não se pode mudar ou amadurecer idéias, quando se têm razões para tal. Isso seria traição intelectual. Nem estou dizendo que o comunismo está acima de qualquer crítica. Devemos ter coragem e honestidade, nós da esquerda, para perceber nossos próprios erros, até para que não se repitam. Mas a questão do ex-comunista é mais profunda. Afinal, porque alguém se torna comunista, antes mesmo de conhecer a teoria a fundo? Acredito que a questão primordial é a defesa da justiça social, ideal ético do comunismo. Até porque é isso o que acontece na maioria das vezes. Che Guevara, por exemplo, teria dito uma vez que não era um marxista de origem, mas que havia encontrado no marxismo a base teórico-ideológica para o seu ideal de justiça social. O mesmo aconteceu com líderes populares da América Latina ou do Oriente Médio. O ideal primevo é a luta social, e muitas vezes antiimperialista.
            Mas como explicar a absurda reviravolta? De um dia pro outro defesa do social transforma-se na defesa do capital. Amadurecimento? A experiência de quem conhece as argumentações desses caras, prova a ilogicidade dessa hipótese. Meu palpite é que o ex-comunista é um revoltado consigo mesmo. Não tem coragem, ou inteligência, para defender algo coerentemente. E vive se culpando por isso. Quer viver uma rebeldia idílica, sem prestar contas a ninguém, mas não tem coragem de se desfazer do conforto que os bons empregos, os altos salários e os amigos ricos lhe proporcionam. São aqueles caras que querem entrar pra história, mudar o mundo, lutar pelos pobres, mas não tem peito para enfrentar os sacrifícios que isso acarreta. Mantém a auto-estima baixa. São invejosos. Sua saída, então, é o puro ataque àqueles que são o que sempre sonhou ser, mas não tem coragem. Chama-os de sonhadores, utópicos, idealistas, imaturos. Criam adjetivos para si mesmos, como pragmáticos ou realistas, compensando no seu subconsciente a baixa auto-estima que sente.
            Para comprovar isso, basta comparar o discurso de um ex-comunista, com um direitista “de nascença”. Estes últimos, como o professor Orlando Fedeli, o economista Roberto Campos, ou mesmo o Jair Bolsonaro, concorde-se ou não com suas idéias, e eu não concordo, possuem uma argumentação sem rodeios. Eles têm certeza do que querem e defendem. O ex-comunista, ao contrário, fica horrorizado com quem o chama de direitista. Suas conceituações são arremedos dos discursos da juventude. Eles continuam usando o apelo social e os chavões de um esquerdista. Na verdade, sofrem da mais horrorosa “esquizofrenia intelectual”. Não sabem o que querem, nunca souberam. Sentem um desejo urgente de aparecer. Precisam de platéia para sentir que são alguma coisa, que defendem algo importante.
            Dessa forma fica fácil identificar até um futuro ex-comunista. Eu, por exemplo, conheço vários: aquela jovem filiada ao PSTU, mas que só vai a lugares “chiques”; aquele professor que vive falando em defesa da pluralidade, mas que é intransigente com os outros; aquele rapaz que se orgulha de não assistir à Rede Globo, mas que chama funcionários públicos de vagabundos; aquela feminista radical, mas que só se relaciona com homens farristas, idiotas e extremamente machistas. Mistura de radicalismo irracional com individualismo materialista. 

2 comentários:

  1. Texto fantástico. É exatamente isso que ocorre!
    Percebo muitos futuros ex-comunistas ainda no movimento estudantil da UnB, onde estudo.

    Abraço,
    Juliano Berquó.

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