Meu
pai, que era um fumante inveterado, dizia que não há nada pior que um
ex-fumante. Aliás, pior que isso só um ex-comunista. Por força de um processo
de (de)formação mental inexplicável, o ex-comunista não se torna só um
direitista. Ele passa a deter um discurso do mais baixo nível intelectual e
analítico e do mais raivoso e desembasado apologismo ideológico. Não se torna
um dialogante. Torna-se um sem-argumento, usando do puro ataque como arma
discursiva.
Exemplos
pululam por aí: Reinaldo Azevedo, Arnaldo Jabor, Roberto Freire, Aloysio Nunes
Ferreira, Soninha Francine, entre outros. E o discurso é sempre o mesmo, algo
do tipo: “Na juventude eu era um incendiário, um rebelde. Na minha imaturidade
da época, fui doutrinado pelos ideais de Marx, Lenin, Trotsky, Mao, e me tornei
contra ‘tudo o que está aí’. Mas, graças a Deus (ou não, já que alguns
continuam ateus materialistas) fui crescendo, adquiri maturidade, e vi que a
realidade era outra. O que interessa é o emprego, a posição social e o
dinheiro. Ir contra isso é pura utopia. Temos agora que livrar o mundo dessa
raça, que busca através da mera anarquia, conquistar jovens incautos, como eu
fui um dia, na busca por revalorizar a sociedade, tratando com igualdade os
desiguais, entregando o mundo ao caos.”
Quero
deixar claro que não estou falando aqui que não se pode mudar ou amadurecer
idéias, quando se têm razões para tal. Isso seria traição intelectual. Nem
estou dizendo que o comunismo está acima de qualquer crítica. Devemos ter
coragem e honestidade, nós da esquerda, para perceber nossos próprios erros,
até para que não se repitam. Mas a questão do ex-comunista é mais profunda.
Afinal, porque alguém se torna comunista, antes mesmo de conhecer a teoria a
fundo? Acredito que a questão primordial é a defesa da justiça social, ideal
ético do comunismo. Até porque é isso o que acontece na maioria das vezes. Che
Guevara, por exemplo, teria dito uma vez que não era um marxista de origem, mas
que havia encontrado no marxismo a base teórico-ideológica para o seu ideal de
justiça social. O mesmo aconteceu com líderes populares da América Latina ou do
Oriente Médio. O ideal primevo é a luta social, e muitas vezes
antiimperialista.
Mas
como explicar a absurda reviravolta? De um dia pro outro defesa do social
transforma-se na defesa do capital. Amadurecimento? A experiência de quem
conhece as argumentações desses caras, prova a ilogicidade dessa hipótese. Meu
palpite é que o ex-comunista é um revoltado consigo mesmo. Não tem coragem, ou
inteligência, para defender algo coerentemente. E vive se culpando por isso.
Quer viver uma rebeldia idílica, sem prestar contas a ninguém, mas não tem
coragem de se desfazer do conforto que os bons empregos, os altos salários e os
amigos ricos lhe proporcionam. São aqueles caras que querem entrar pra
história, mudar o mundo, lutar pelos pobres, mas não tem peito para enfrentar
os sacrifícios que isso acarreta. Mantém a auto-estima baixa. São invejosos.
Sua saída, então, é o puro ataque àqueles que são o que sempre sonhou ser, mas
não tem coragem. Chama-os de sonhadores, utópicos, idealistas, imaturos. Criam
adjetivos para si mesmos, como pragmáticos ou realistas, compensando no seu
subconsciente a baixa auto-estima que sente.
Para
comprovar isso, basta comparar o discurso de um ex-comunista, com um direitista
“de nascença”. Estes últimos, como o professor Orlando Fedeli, o economista
Roberto Campos, ou mesmo o Jair Bolsonaro, concorde-se ou não com suas idéias,
e eu não concordo, possuem uma argumentação sem rodeios. Eles têm certeza do
que querem e defendem. O ex-comunista, ao contrário, fica horrorizado com quem
o chama de direitista. Suas conceituações são arremedos dos discursos da
juventude. Eles continuam usando o apelo social e os chavões de um esquerdista.
Na verdade, sofrem da mais horrorosa “esquizofrenia intelectual”. Não sabem o
que querem, nunca souberam. Sentem um desejo urgente de aparecer. Precisam de
platéia para sentir que são alguma coisa, que defendem algo importante.
Dessa
forma fica fácil identificar até um futuro ex-comunista. Eu, por exemplo,
conheço vários: aquela jovem filiada ao PSTU, mas que só vai a lugares
“chiques”; aquele professor que vive falando em defesa da pluralidade, mas que
é intransigente com os outros; aquele rapaz que se orgulha de não assistir à
Rede Globo, mas que chama funcionários públicos de vagabundos; aquela feminista
radical, mas que só se relaciona com homens farristas, idiotas e extremamente
machistas. Mistura de radicalismo irracional com individualismo materialista.
Texto fantástico. É exatamente isso que ocorre!
ResponderExcluirPercebo muitos futuros ex-comunistas ainda no movimento estudantil da UnB, onde estudo.
Abraço,
Juliano Berquó.
Muito bom !!!
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